Introversão e extroversão no autismo: por que uma coisa não exclui a outra?


INTROVERSÃO E EXTROVERSÃO no autismo

Postado por Autismo em Dia em 17/mar/2022 - 2 Comentários

Aquela ideia de um autista como uma pessoa isolada, quieta, que sempre prefere a solidão em vez de interações com pessoas é um clássico. Existe, ainda, muita gente que pensa no autista como alguém naturalmente introvertido. De certo modo, há um tanto de razão nisso. Afinal, grande parte dos autistas encaram, diariamente, desafios sociais que levam a essa imagem de alguém que não tem interesse em conversar. Mas introversão e extroversão no autismo é um assunto que guarda algumas surpresas, já que o próprio TEA tem muitas variáveis.

Será mesmo que todos os autistas são introvertidos e nenhum consegue ser extrovertido? Será que ser extrovertido faz com que a pessoa seja “menos autista”? É sobre isso que falaremos a seguir.

Fonte: Envato – halfpoint

Índice

O que é introversão?

Resumidamente, podemos definir que uma pessoa introvertida é uma pessoa cujo comportamento é mais introspectivo, ela costuma ser menos expansiva e pode inclusive ter que lidar com alguma ansiedade em situações que necessitem de interação com mais pessoas. Sendo assim, uma pessoa extrovertida é aquela cuja energia e ideias são alimentadas justamente com o engajamento social.

Aqui, vale ressaltar que é normal ter vontade ou necessidade de passar um tempo sozinho sem, necessariamente, ser uma pessoa introvertida. Alguns testes de personalidade, por exemplo, já separam bem uma coisa da outra.

Em geral, pessoas com a introversão em vez da extroversão como traço marcante de personalidade até gostam de passar tempo com outras pessoas. Porém, elas sentem que é extremamente cansativo estar no meio de grupos maiores.

LEIA TAMBÉM: Autismo em palavras – 15 termos para entender o autismo

A introversão no autismo

A relação da introversão com o autismo não é apenas história de conhecimento popular. Já existem estudos científicos voltados para entender as teorias que relacionam as duas coisas. Uma delas é bem recente, aliás. É uma teoria desenvolvida por Jennifer Grimes, em 2010, com a Universidade Central da Florida, nos Estados Unidos.

Grimes publicou um estudo aprofundado sobre introversão e extroversão no autismo, em que ela defende que existe, de fato uma relação entre o TEA e a introversão, mas sem, necessariamente, excluir a possibilidade de extroversão.

De 2010 para cá, os estudos de Grimes continuam sendo discutidos e gerando novas ideias na ciência. Ainda que, historicamente, alguns estudiosos tenham rebatido as ideias, afirmando que esses traços de personalidade são comuns, mas não estão diretamente ligados.

autismo personalidade

Fonte: Pexels – Foto de Eduardo Dutra

Por que a introversão é associada ao autismo, mas a extroversão não?

O autismo é, sem dúvida, um transtorno do desenvolvimento. E, neste caso, muitas vezes, é definido pelas dificuldades de comunicação social. Além disso, elas podem ser sutis ou extremamente evidentes. Uma pessoa que seja considerada um autista de alto funcionamento, por exemplo, pode achar mais difícil manter o contato visual ou mesmo não saber reconhecer quando alguém está sendo provocativo, irônico ou ofensivo.

Por outro lado, autistas mais severos podem ter, em muitos casos – mas não todos – dificuldade de usar a linguagem falada. Aqui, fazemos referência aos autistas não verbais que, ainda que não sejam mudos, podem não desenvolver a fala.

Ações como fazer contato visual, usar a linguagem corporal de forma dinâmica e expressar pensamentos em fala são algumas das ferramentas mais importantes para a comunicação. E já que, na maioria das vezes, a comunicação social é tão desafiadora para os autistas, é comum que eles não sejam tão habilidosos quando o assunto é se envolver socialmente. É, sem dúvida, frustrante e exaustivo para quem vive dessa forma.

Eles podem ou não desejar esse envolvimento, podem ou não buscarem amizades e relacionamentos amorosos. Porém, estamos falando de um processo que não é nem simples e nem natural para neuroatípicos.

Exemplos de situações que podem levar à introversão

A seguir, abordaremos mais algumas situações que podem levar à introversão de um autista.

  • Leitura de expressões. Muitos autistas não conseguem ler bem as expressões faciais dos outros, assim como o tom de voz, também. Isso dificulta muito a troca usual de uma conversa.
  • Formação de respostas. Alguns autistas podem não ter a mesma destreza de um neurotípico para formular respostas rápidas. Uma conversa que aconteça entre um autista com esse traço e uma pessoa típica pode demandar muita paciência e compreensão.
  • Gestos físicos. Aqueles gestos comuns de comunicação como trocar olhares, apertar as mãos, dar abraços etc. podem ser um desafio duplo. Tanto podem passar por questões de não saber exatamente o porquê e o como fazer, como o autista pode ter uma barreira sensorial.
  • Reprodução de comportamentos. Quem não é autista, numa situação social que envolva uma comunidade inteira, tende a “se misturar”, imitando comportamentos. Isso acontece no shopping, na igreja, na escola e vários outros locais. Para o autista, esse processamento de interpretar o comportamento coletivo e interagir de maneira igual nem sempre é algo automático.
  • Tópicos de conversa. Em geral, as pessoas são múltiplas, conversam sobre diversos assuntos. É comum que alguns autistas acabem focando em tópicos fixos, principalmente se for um caso de hiperfoco.
  • Sensibilidade. As questões sensíveis de um autista geralmente passam por sons, luzes, cheiros, texturas, entre outros. Um ambiente coletivo tem tudo isso e de uma forma amplificada. É quase impossível “higienizar” locais coletivos em prol de uma pessoa neurodivergente, fazendo com que ela evite, sempre que pode, locais que exijam tanto de seus aspectos sensoriais.

Perceba, mais uma vez, o quanto a questão da introversão e da extroversão é, muitas vezes, uma questão de o autista escolhendo a situação menos avassaladora.

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pessoas extrovertidas

Fonte: Pexels – Foto de Helena Lopes

Introversão e extroversão no autismo: quais são as diferenças?

A introversão não deve ser um impedimento ao relacionamento e à comunicação de um autista. Assim como a extroversão não deve ser um fator de apagamento do transtorno. A seguir, entenderemos melhor algumas características das duas coisas e compreender como elas podem ser impulsionadas de um jeito eficaz.

O autista introvertido

A maior parte dos autistas provavelmente será descrita como introvertida. Porém, a comunicação dessas pessoas funciona, só que em escalas menores, em que eles têm mais espaços para se entenderem. Veja a seguir, por exemplo, os benefícios de uma interação em grupos menores.

  • Ritmo mais lento, tornando mais fácil de um autista compreender o parceiro da conversa e respondê-lo de uma maneira que faça a conversa avançar.
  • Menos caos. Uma conversa de poucas pessoas tem menos barulho e menos distração do que, por exemplo, salas de aula ou dinâmicas de grupo.
  • Em geral, menos pessoas significam maior foco nos pontos centrais da conversa. Quando um autista se sente à vontade para interagir com alguém, maiores são as chances de ele reter a atenção daquela pessoa e fazer daquele momento algo mais satisfatório.
  • Há mais tempo para reflexão e planejamento de conversas.
  • menos espaço para mal-entendidos, pois uma quantidade reduzida de pessoas também significa uma menor quantidade de sinais a serem interpretados.

Novamente, reforçamos aqui que um comportamento introvertido não necessariamente implica em aversão a relacionamentos sociais.

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O autista extrovertido

O autista pode, de fato, ser extrovertido. No entanto, isso não quer dizer que ele não passe por dificuldades. Lembrando, como dissemos no início, a diferença entre introversão e extroversão está nas motivações das relações. No caso do extrovertido, há um interesse maior em extrair coisas excitantes a partir da interação com várias pessoas.

Porém, a seguir, vamos entender melhor como isso pode ser igualmente desafiador.

extroversão e introversão no autismo

Fonte: Pexels – Foto de Keira Burton

Nem sempre dá para disfarçar o autismo

Não, não estamos dizendo que o autismo deve ser escondido. Porém, mesmo diante do interesse na extroversão, outras características podem ser marcantes o suficiente para destacá-lo no meio da multidão como alguém diferente. Às vezes vira algo positivo, às vezes vira alvo da discriminação e do preconceito.

Se o objetivo for, de fato, se passar por alguém que não é tão diferente dos demais, é natural que a pessoa escolha disfarçar algo que faz parte de si. Não podemos julgar o que é certo ou errado, cada pessoa sabe quais dificuldades são mais ou menos incômodas.

Vamos dar alguns exemplos:

Digamos que a pessoa trabalhe pela sua extroversão, porém tenha dificuldade em interpretar sinais de comportamento e, por isso, de vez em quando solte dizeres mais ríspidos. Claro que muitas pessoas não irão entender ou sequer gostar disso.

Além do mais, quanto mais extrovertida for a pessoa, mais ela recebe uma interação extrovertida. Ou seja, as pessoas ao redor podem se sentir mais à vontade para abraçar, cumprimentar com beijo, falar tocando, entre outras coisas. Os limites do espaço individual ficam mais estreitos na visão das pessoas ao redor. Será que o autista conseguirá lidar com tantos toques, cheiros e sensações que isso carrega?

Viu só como extroversão e introversão rendem muito mais do que o que está aparente no autismo? Agora, você já sabe que ninguém é melhor do que o próprio autista para definir se é uma pessoa introvertida ou extrovertida.

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Até a próxima! =)

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Este artigo foi livremente baseado no texto Are Autistic People Introverts?, do portal internacional Verywell Health.

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2 respostas para “Introversão e extroversão no autismo: por que uma coisa não exclui a outra?”

  1. Rita de Cássia Silveira Cambruzzi disse:

    Gostaria de parabenizar a equipe, pois o texto foi esclarecedora desmistificando as ideias sobre o autismo, que muitas pessoas possuem. mas que já está mudada proporcionando uma transformação no olhar sobre o AUTISMO. PARABÉNS!

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