Diagnóstico tardio do autismo: jovem de Curitiba conta como superou as dificuldades


diagnóstico tardio do autismo

Postado por Autismo em Dia em 16/dez/2022 - 5 Comentários

Imagine viver uma vida inteira com dificuldades de interação, se sentindo estranho, e nunca se entender por completo. Para Igor Martiniano, um jovem músico e jornalista natural de Manaus e que hoje vive em Curitiba, a história foi bem assim. Ele teve um diagnóstico tardio do autismo. E bem tardio mesmo. Foi só aos 28 anos que ele, de fato, descobriu. 

Isto porque ele, que sempre se achou excêntrico, nunca tinha tido suporte da própria família para ir atrás de respostas. Agora, aos 29 e vivendo uma fase totalmente nova, ele reflete, junto com a gente, tudo que mudou depois do diagnóstico.

Jovem autista

Fonte: arquivo pessoal – cedido por Igor Leonardo Augusto Martiniano.

Índice

Como aconteceu o diagnóstico tardio do autismo

É curioso notar que, assim como outras pessoas que já passaram pelo nosso quadro de ProTEAgonistas, Igor faz parte de uma geração que ainda era muito distante do conceito de autismo durante a infância. Isto porque é na infância que os primeiros sinais aparecem.

Ainda mais quando se trata de um autismo de sinais leves, que pode acabar sendo rotulado como comportamento estranho para muitas pessoas. Igor passou a maior parte da vida com suas diferenças invisibilizadas, até para ele mesmo.

Depois de passar a ter autonomia e começar a ter a vida nas próprias mãos, seus vinte e poucos anos foram um período em que ele começou a se perguntar muitas coisas.

“Eu comecei a me perguntar: será que possuo autismo? Afinal, eu tenho traços, eu me conheço muito bem, tenho algumas manias que não sei explicar por que tenho. Então eu fui procurar um psicólogo, algo que, na minha visão, eu nunca tinha precisado.

Eu fiz isso em total segredo, não queria que ninguém soubesse. Venho de uma família em que, falando o português claro, tudo é frescura. E, me consultando, eu descobri que era muito normal descobrir o autismo depois de adulto. A psicóloga me disse que eu não era o primeiro e nem seria o último”, conta Igor.

Lidando com as descobertas

Sendo um adulto consciente de que o diagnóstico tardio do autismo era uma coisa importante, Igor conta que não soube, a princípio, lidar muito bem.

“Eu fiquei com uma sensação de ‘meu Deus, eu sou defeituoso, vim com defeito de fábrica, não sou normal’. Mas aí, depois de um tempo, fui me acostumando com a ideia e percebi que não tenho defeito nenhum. São só alguns aspectos que me diferenciam, um pouco, das outras pessoas.

Ao longo da minha vida fui quebrando as barreiras que eu tinha por puro instinto, porque eu não sabia que era autista”, explica.

Uma lembrança que ele cita é de, quando criança, irritar demais seus pais pela reação inerte quando alguém o corrigia e castigava.

“Eu não fazia nada. E isso irritava eles. Até hoje, quando tem briga ou discussão por perto, eu me afasto. E eu não sou do tipo de pessoa que desabafa. Na maioria das vezes, eu não falo se não falaram comigo. Fazendo uma restrospectiva, tudo isso já confirmava.”

Histórico de autismo na família

O diagnóstico tardio de autismo veio para ele, mas não para sua irmã por parte de pai, que é autista de nível severo de dependência. Igor também concorda, isso pode ajudar a explicar por que sua família jamais desconfiou de sua condição, já que os sinais eram muito mais evidentes em sua irmã. Isso parecia tornar qualquer dificuldade menor em Igor, um tanto quanto irrelevante – o que agora é algo totalmente refutado.

diagnóstico tardio de autismo

Fonte: arquivo pessoal – cedido por Igor Leonardo Augusto Martiniano.

Encontrando refúgio na arte antes do diagnóstico do autismo

Igor conta que, como forma de regular essas emoções guardadas, ele deixa aflorar o que ele chama de sua criança interior. E que sua paixão pela música, pelos desenhos e pela profissão, o jornalismo, tudo isso o ajudou grandemente em todos esses anos.

“A música e o jornalismo ajudaram, principalmente, na minha parte social. Eu era muito recluso, e essa concha foi quebrando. Mas foram dois lugares onde eu me encontrei, de várias formas”, conta.

Igor relata que suas experiências no palco, cantando em bandas, foram, no começo, muito desafiadoras.

Foi a barreira mais difícil de quebrar, justamente porque eu estava à frente da banda. Eu não sabia puxar um assunto, não sabia falar com o público. Eu só esperava a próxima música começar para poder cantar. Foi meu irmão, o tecladista, quem me deu o toque de que eu precisava superar isso.

Então comecei a estudar a performance de palco de outros vocalistas. E eu sempre fui recluso, mas nunca fui depressivo, gosto de alegrar os ambientes. Foi nisso que, então, eu comecei uma improvisação de humor no palco. Fazia piada com as falhas do som, com o garçom, com o pessoal que bebia demais e fazia muito mais barulho que a banda.

Acabei levando a experiência dos palcos para a vida. Passei a me relacionar melhor não só com quem assistia o show, mas também, com a minha família, meus amigos, meus colegas de faculdade, passei a perguntar mais nas aulas. Isso tudo mexeu demais comigo”, diz Igor.

história real autista curitiba

Fonte: arquivo pessoal – cedido por Igor Leonardo Augusto Martiniano.

As dificuldades de se abrir na sociedade

Logo depois de receber o diagnóstico, Igor saiu de Manaus para morar sozinho em Curitiba. Um desafio e tanto para alguém que tende a ser mais isolado. Porém, a descoberta do autismo permaneceu guardado com ele. O próximo passo era entender se esta era uma informação que ele abriria às pessoas ou não, já que isso impactaria diretamente nas relações que viriam a ser construídas na nova cidade e na busca por um emprego.

“Às vezes rola um impedimento dentro da minha cabeça porque me pedem para falar um pouco de mim. E a primeira coisa que passa é ‘eu sou autista’. Só que é difícil para mim, e eu só falo quando necessário.

Eu ainda defino as pessoas, abro exceções. Falar de autismo é um tabu que eu estou quebrando comigo mesmo. Para a minha família, por exemplo, levou quase um ano para eu contar. Isto porque as pessoas te olham diferente. E isso aconteceu em um trabalho que eu tive. Uma coordenadora me cobrou por uma coisa e eu não gostei. Então eu fui explicar para ela o porque de eu ter certas atitudes.

Eu tive, naquele momento, que contar para ela que eu sou autista. E ela já me olhou de um jeito que eu não gostaria que ela olhasse, como coitado. E é muito ruim a pessoa ter essa percepção. Por que por mais que você diga para as pessoas de que não precisa pisar em ovos, é assim que algumas fazem. E não dá para fugir da realidade de que o autista, para efeitos legais, é um PCD”.

Um novo momento

Estimulado por sua psicóloga, Igor hoje deseja viver uma vida em que ele possa realizar seus sonhos independente de qualquer dificuldade de comunicação e interação social. Estas que, inclusive, ele segue no desejo de evoluir.

Ele, atualmente, ainda não atua dentro do jornalismo. Igor trabalha na telefonia de um hospital, espaço que, apesar de não ser o que ele almeja, ajuda a pôr em prática as lições de oratória e o manejo da pressão do próprio ambiente hospitalar. Ele conta que, na sua equipe, inclusive, é o grande piadista, buscando sempre manter o clima leve e o bom humor.

Para o próximo ano, ele planeja entrar para uma pós-graduação em sua área, desenvolver projetos que tem com um amigo da época da faculdade e terminar de escrever dois livros nos quais ele vem trabalhando. E a gente deseja toda sorte do mundo pro Igor!

ProTEAgonistas – lugar de grandes histórias

Assim como o Igor, muitas pessoas tem uma história com o autismo capaz de servir de espelho para outras pessoas. Por isso, nós queremos ouvir e contar cada uma delas. Se você é pai, mãe, parente próximo, cuidador ou tem qualquer outro tipo de relação com um autista – ou é o próprio -, entre em contato pelas nossas redes sociais Instagram ou Facebook.

Aliás, por lá você também fica por dentro de diversos conteúdos informativos sobre o TEA, numa linguagem acessível e verificada por profissionais da área.

Para ler outras histórias, clique aqui e conheça outros proTEAgonistas!

Esperamos ver você de volta por aqui. Muito obrigado pela leitura e até a próxima!🙂

 

 

 

“O Autismo em Dia não se responsabiliza pelo conteúdo, opiniões e comentários dos frequentadores do portal. O Autismo em Dia repudia qualquer forma de manifestação com conteúdo discriminatório ou preconceituoso.”

5 respostas para “Diagnóstico tardio do autismo: jovem de Curitiba conta como superou as dificuldades”

  1. Igor Martiniano disse:

    Obrigado pelo espaço e por me permitirem compartilhar um pouco da minha história e do meu caso. Espero que isso possa ajudar outras pessoas. Deus abençoe!

  2. Suzana disse:

    Muito bom seu relato, estava procurando informações sobre como descobrir autismo em adolescentes, quais os comportamentos nessa idade,
    pois só encontro falando sobre crianças pequenas .
    Esse seu testemunho é esclarecedor

  3. Edna Rodrigues Vieira disse:

    Que relato fantástico Igor!!! Parabéns pela coragem em compartilhar sua história…Sou professora de classe regular com autistas e a inclusão ainda está caminhando a passos lentos. O assunto é relativamente novo e as indagações são muitas.

  4. Renata disse:

    Eu estou para fazer o diagnóstico e algo que estava me prendendo muito de não fazer era o fato de eu ser a piadista de todos os lugares, mas lembro que comecei a fazer piada com tudo depois de ver uma amiga sempre fazendo piadas e sendo bem aceita. Mas eu tinha pra mim que um autista nunca iria conseguir fazer piadas e ter esse tipo de interação, e agora vendo o relato dele vi que não é isso que irá ser decisivo pro diagnóstico de TEA. Mas tenho medo justamente dessa mudança das pessoas pisarem em ovos e me ver como coitadinha.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *


error: Este conteúdo é de autoria e propriedade do Autismo em Dia