Adolescente com grau leve de autismo lança seu primeiro livro


Postado por Autismo em Dia em 24/jan/2021 - 6 Comentários

Muitas mães e pais de autistas vêm fortalecendo a comunidade através das redes sociais. Assim, esse tem sido um meio muito importante de compartilhamento de histórias inspiradoras. Foi assim, também, que a gente conheceu a Luciane Toniolo, que mora em Imbé, no litoral do Rio Grande do Sul. Ela é a mãe do Cauã, que é apaixonado desde sempre por livros, por histórias e tem um grau leve de autismo.

Cauã acabou de lançar o livro “A timeline da terra”, que é resultado de muitas coisas que aconteceram na vida dessa família em 2020 – um ano nada normal, podemos dizer. Por isso, nós fomos conversar com a Luciane, que contou para nós um pouco da sua história com o filho de 12 anos.

Essa é mais uma super história de proTEAgonismo que a gente vai amar compartilhar com você. Então vem com a gente descobrir quem é o Cauã.

 

Autista adolescente

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Luciane. – Cauã e Luciane.

Índice

Grau leve de autismo: o diagnóstico

O diagnóstico de grau leve de autismo em Cauã demorou bastante. Justamente porque é o grau mais brando do transtorno. Foi só aos 10 anos que o garoto teve, enfim, o diagnóstico fechado por um médico.

Além disso, os primeiros sinais foram inegavelmente positivos e precoces. Cauã demonstrou, já nos primeiros meses, uma inteligência acima da média. Ele começou a falar com nove meses e, segundo a mãe, de forma bastante correta e bem definida. Para a surpresa dos pais, algumas dessas palavras nem mesmo eram português, mas sim em inglês. Aos dois anos, já sabia ler e interpretar textos, tanto quanto fazer algumas tarefas no computador.

A partir daí, um misto de orgulho e alerta tomou conta de Luciane e de seu esposo, pai de Cauã. Assim, eles partiram para a investigação médica do que havia de diferente no filho.

“Até o diagnóstico foi bem sofrido. As pessoas consideravam ele mal educado porque as respostas eram muito sinceras e ele tem os cinco sentidos muito aguçados. Ele não gosta de muito barulho nem de luz forte, por exemplo”, conta Luciane.

O impacto do diagnóstico

Já bem crescido, Cauã foi parar numa clínica escola, onde Luciane encontrou suporte, de fato, através de uma educadora especializada em crianças especiais. A profissional fez algumas avaliações em Cauã e encaminhou para um neuropediatra que, enfim, pôde confirmar o autismo em Cauã.

“Quando a gente recebe o laudo positivo, o chão da gente cai. Para nós como mãe e como pai, é muito difícil de a gente admitir que o filho é autista. Porque rola muito preconceito e muita ignorância das pessoas. Então eu fiquei apavorada. Mas com toda a equipe da clínica escola a gente conseguiu superar isso. Mas ao mesmo tempo em que o chão cai, a gente tem um alívio por saber que existe um diagnóstico”, conta a mãe.

Uma vez que tem o diagnóstico em mãos, Luciane conta que a família começou uma série de atividades de suporte à condição do menino. Ela mesmo chama assim porque, segundo ela, Cauã não precisa de tratamentos, num sentido mais médico da palavra.

grau leve de autismo

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Luciane..

Grau leve de autismo, conhecimento e escola

Quando familiares e amigos da família perguntavam para Cauã o que ele queria ganhar no natal, ele sempre queria livros. E de todo tipo de literatura. Até mesmo títulos mais adultos como A Lista de Schindler, que fala dos horrores da Segunda Guerra Mundial, tinham vez nos interesses do menino.

Não que os pais nunca tivesse incentivado o hábito do filho, mas, segundo Luciane, esse desejo veio dele mesmo. Aliás, esse perfil autodidata também vem valendo para várias outras coisas, como a tecnologia e o conhecimento escolar. Porém, ser autodidata, no caso de Cauã, também chama atenção para a sua relação com o ensino tradicional das escolas.

“Em qualquer turma que ele estivesse [da escola regular] ele estava sempre à frente da turma em conhecimento. E isso sempre deu problema. Os professores não estão preparados para a mente brilhante de um menino com altas habilidades. Por isso ele nunca gostou de colégio. Quando a gente morava em Santa Maria [também no RS], tínhamos disponível equipes preparadas com educadores especiais na escola. Mas aqui no litoral não tem nada disso e foi a ainda pior. Foi traumatizante para ele”, diz.

Depois da frustração, uma vida nova

Assim como você pode estar se perguntando, nós também questionamos Luciane por que, afinal, a família permaneceu numa cidade com poucos recursos quando isso pareceu ser uma opção ruim para a educação do filho autista.

A resposta está no próprio Cauã. Ele tinha sido aprovado para um colégio militar em Santa Maria, mas a escola disse que não estaria preparada para recebê-lo enquanto seu novo projeto para receber alunos com habilidades e necessidades especiais não estivesse pronto. Frustrado com com isso, já que ele sonha em seguir uma carreira militar, Cauã disse para os pais que gostaria de ir morar perto da praia.

Como Luciane e o marido já são aposentados, existia a liberdade de fazer essa mudança. Por isso eles resolveram levar a vontade dele, o que, segundo ela, foi altamente recomendado pelos profissionais que cuidavam do menino. Hoje ele se sente muito bem perto da praia. Seu problema é mesmo com a questão de frequentar uma escola, o que gerou uma outra decisão dos seus pais.

Adolescente autista lança livro

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Luciane.

Homeschooling: porque Cauã precisa estudar em casa?

Na cidade onde Luciane e Cauã vivem ainda não existe uma lei que permita que o homeschooling, ou seja, a educação escolar feita em casa, sem ser feita por uma escola. Mas 2020, como já dissemos, não foi um ano normal. Por causa da pandemia da covid-19, todas as escolas brasileiras tiveram que mandar seus alunos para casa, fazendo as aulas via internet.

Para Cauã, isso foi um alívio. Além de continuar indo bem nas matérias, ele se sente muito mais confortável nessa situação. E por causa disso, Luciane e o marido agora lutam na justiça para que Cauã possa estudar no método homeschooling. Mesmo com a volta às aulas presenciais em 2021, Luciane não pretende mandar o filho para a sala de aula.

“Estou me baseando nisso [a experiência das aulas online] para defender o ensino dele em casa, mesmo depois da pandemia. Ele avançou tanto nesse período que eu já consegui com a diretora da escola, que é uma pessoa maravilhosa,  que ele avançasse para o nono ano antecipadamente. Para a minha família isso tem dado muito certo”, conclui.

Adolescente com grau leve de autismo e o talento para a escrita

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Luciane.

Cauã no lançamento de seu livro. Foto do arquivo pessoal.

A timeline da Terra

Aos 12 anos, Cauã se orgulha de uma conquista que é algo raro para alguém tão jovem: a publicação de um livro. “A timeline da Terra” é o título de sua primeira publicação. Esse é um livro que mistura ficção e realidade. Aqui, Cauã conta fatos curiosos sobre a história de do planeta Terra ao mesmo tempo que discursa com algumas ideias que ele mesmo desenvolveu sobre mistérios ainda não esclarecidos sobre o nosso planeta.

Apesar de Cauã sempre ter sido apaixonado por ler, a história por trás de seu primeiro livro não começou exatamente por conta disso. Na verdade, isso tem origem num período bem complicado da vida da família.

Depois de mudarem para Imbé, Luciane, claro, teve que matricular Cauã numa escola local. Na teoria, essa escola deveria dar conta de todos os alunos especiais da região. Porém, segundo conta Luciane, a escola nunca esteve preparada para tal. Ela e outros pais brigaram na Justiça, mas o resultado não foi lá grande coisa. O que aconteceu foi que um Juiz obrigou os pais a mandarem os alunos para esse colégio em horários reduzidos, sendo duas vezes na semana.

Mas a resistência do menino foi tão grande que ele tinha crises desesperadoras. “Foi muito triste o que a gente passou”, conta a mãe.

Uma bem vinda solidão criativa

Não satisfeita, Luciane apelou à vice-diretora da escola, a quem ela enche de elogios, que cedesse uma sala exclusiva para ele só ficar lá escrevendo. Não era para ser um grande projeto, porém, em 15 dias, o livro estava pronto.

Orgulhosa do feito do filho, Luciane resolveu levar o projeto à frente e tentou patrocínio para pagar a produção, mas encontrou barreiras. Pelo fato de eu não ficar quieta, de eu ter reclamado bastante de não ter os profissionais adequados, então nós fomos ignorados, discriminados. Ninguém quis patrocinar o livro. Aí eu recorri à clínica Mundo Novo, em Santa Maria [onde Cauã fazia terapias antes da mudança], e eles abraçaram a causa, explica Luciane.

O livro é um sucesso dentro e fora da comunidade de famílias autistas. Tanto em Imbé como em Santa Maria, a história ganhou destaque em jornais, rádios e até na televisão. Inclusive Luciane já recebeu proposta de uma editora de uma cidade vizinha para o relançamento do livro em versão digital.

Pai de autista

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Luciane. Cauã em momentos divertidos com o pai.

Grau leve de autismo: as dificuldades e as alegrias

Certamente que não dá para reduzir a história de Luciane e Cauã apenas ao período recente. Mas, olhando de perto, fica claro que os últimos meses ajudaram a fazer da história deles um marco na comunidade autista. E isso é algo que primeiro marca localmente e muda a vida de algumas pessoas. Mas depois o exemplo de superação chega em muito mais gente, de todo o Brasil, que acaba conhecendo essa história.

Entre altos e baixos, perguntamos para ela o que todos esses acontecimentos significaram para a família.

“Tudo isso mudou muita coisa pra gente. Nós viemos de uma cidade grande para uma cidade muito pequena e sem tantos recursos. Aí a gente sente na pele a necessidade de gente capacitada e interessada em valorizar os especiais. A gente percebe também o quanto há ignorância nesse assunto. Então a gente quer mudar o mundo. A gente tem necessidade de correr atrás de fazer com que as pessoas sintam o que a gente sente, de abrir a cabeça das pessoas e mostrar que o mundo azul é um mundo maravilhoso. Que eles têm capacidade e inteligência. 

Mas o que eu também tiro de lição é a superação do meu filho. 24 horas por dia eu aprendo com ele. Aprendo que não são as pessoas más e o mundo cruel que vão fazer ele desistir. O que eu quero para ele é a vitória, mas que ele também não sofra. Então eu mostro muito a realidade das coisas para ele. Mas ele é tão maduro que é capaz de entender”, termina Luciane.

Venha contar sua história, também!

Várias famílias, como a da Luciane, já apareceram por aqui para contar suas histórias, seus dramas, suas alegrias. Uma história mais inspiradora que a outra. Essas histórias têm sido espalhadas por todo o Brasil. E, carinhosamente, chamamos essas pessoas de proTEAgonistas. E você pode ser o próximo. Todo mundo é bem vindo, seja sobre grau leve de autismo, moderado ou severo. Cada história é única.

É só entrar em contato pelas nossas redes sociais Instagram ou Facebook e dar um oi pra gente. Esperamos te ver por lá.

Até a próxima! =)

 

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6 respostas para “Adolescente com grau leve de autismo lança seu primeiro livro”

  1. Nara Freitas Deprá disse:

    Parabéns Cauã que está obra seja a primeira de muitas.bjuss da tia

  2. Luciane Toniolo disse:

    Maravilhosa a reportagem, obrigada por ter nos procurado para por a público nossa história

    • Autismo em Dia disse:

      ??? Foi uma honra contar a história de vocês, temos certeza que vai inspirar muitas famílias:)

  3. Roney Soares disse:

    Tenho muito orgulho do Cauã. E quero aproveitar esse espaço para agradecer pela belíssima reportagem.
    Parabéns ao “autismoemdia” fazendo um grande serviço em prol das famílias azuis.

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