Inclusão Humanizada: um projeto de protagonismo autista


inclusão do autista

Postado por Autismo em Dia em 24/jun/2021 - Sem Comentários

Hoje nós viemos apresentar uma iniciativa muito interessante e, de fato, importante: a Inclusão Humanizada. O projeto focado na inclusão do autista no mercado de trabalho surgiu durante o hackathon Autismo Tech de 2020, e conta com uma equipe formada, em sua maioria, por autistas.

Conversamos com Milena Yamamoto, que é autista e a fundadora do projeto, para entender melhor o que é a Inclusão Humanizada, como o projeto surgiu e como funciona o trabalho deles na prática. Então, continue a leitura e confira como foi essa conversa e veja também algumas dicas dadas por Milena para a inclusão do autista no mercado de trabalho.

Vem com a gente!

Índice

O que é a Inclusão Humanizada

Trata-se de uma iniciativa sem fins lucrativos que trabalha com o objetivo de servir como uma ponte para os autistas e o mercado de trabalho, conforme descrito por eles próprios em suas redes sociais Instagram e Facebook (aproveite para segui-los por lá). Eles elaboram conteúdos e workshops sobre a inclusão das pessoas com TEA nas empresas de forma humanizada, e têm um papel importante na conscientização do TEA.

Muitas empresas têm o interesse de se tornarem mais inclusivas, mas não sabem por onde começar. E é aí que entra o projeto, com um método que pretende ajudar essas empresas a incluir as pessoas com autismo em suas equipes. Além disso, os Workshops oferecidos por eles também servem para conscientização dessas equipes, quase sempre formadas por pessoas neurotípicas, para receber a pessoa autista entendendo mais sobre o espectro e a neurodiversidade e outros assuntos relevantes, como o capacitismo, por exemplo.

A Inclusão Humanizada, nas palavras de Milena, a fundadora:

“O que visamos é participar mais de perto das entrevistas e processos seletivos, para ajudar os empregadores a adaptar esses processos de forma adequada para os autistas. Nisso entram muitos pontos, como por exemplo: o tipo de contato que deve ser feito, as palavras adequadas, uma comunicação mais clara e sem figuras de linguagem, etc.

Quanto aos Workshops e palestras, eles servem para a sensibilização dessas empresas e equipes. Nós vemos um índice muito alto de evasão dos autistas tanto no ambiente profissional quanto acadêmico. Ou seja, algo que acontece com frequência é o autista trocar de emprego ou de curso após alguns meses, e isso vai se repetindo nas outras experiências profissionais e acadêmicas. Isso acontece, muitas vezes, graças à falta de inclusão e de flexibilidade quanto às necessidades da pessoa  neurodivergente. Preparar as empresas para essa inclusão e flexibilização é importante para que o autista tenha a oportunidade de se consolidar nessas empresas.

No momento, estamos em um processo de formalização de nosso projeto. A ideia é crescer de forma orgânica para oferecer experiências principalmente para as pessoas que ainda não tiveram contato com o mercado de trabalho.

Queremos mudar essa realidade em que a maioria dos autistas adultos não estão inseridos no mercado de trabalho. Hoje em dia já temos um repositório de vagas disponível para autistas em nosso site, e queremos expandi-lo ainda mais, e é claro, pretendemos continuar oferecendo isso para as pessoas do espectro de forma gratuita.”

inclusão do autista

Fonte: reprodução do site Inclusão Humanizada

Os autistas no papel de protagonismo

Um dos pilares da Inclusão Humanizada é justamente o protagonismo dos autistas na causa. Como dissemos lá no início, o projeto surgiu no hackathon Autismo Tech, uma iniciativa da FIAP de incluir os autistas no mercado de trabalho. Milena conta que esse projeto evoluiu significativamente em suas últimas edições:

“Na primeira edição o Autismo Tech se chamava Challenge Autismo. Quando fui me inscrever e estava preenchendo o formulário, notei que na lista para mapear o perfil do candidato, onde pergunta qual a profissão e qual a relação da pessoa com o autismo, haviam várias opções: se era familiar de um autista, um profissional de saúde, educador… a única opção que não tinha em um evento sobre autista, era justamente, o próprio autista. Nessa hora eu fiquei, de certa forma, revoltada. É inaceitável fazer um evento sobre o autismo e não pensar nos próprios autistas, não pensar que eles existem e que eles podem vir a se inscrever. Então eu não me inscrevi.

Posteriormente o Challenge Autismo virou o Autismo Tech, e eles fizeram várias mudanças positivas, principalmente graças a voz da Joyce Rocha, que é autista e faz parte do projeto. Na nova edição, eles exigiam que cada grupo participante tivesse pelo menos um autista. Então eu pensei: por que não fazer um grupo só de autistas? E foi o que eu fiz. Meu grupo foi o único formado só por autistas, e nós conquistamos o 3o lugar. Esse foi o início de tudo.”

Do hackathon para o mundo

Milena mostrou que não tinha medo de ousar e de mostrar a que veio quando teve a iniciativa inédita de criar um grupo só de autistas para o hackathon. Como ela mesma nos disse, ela entrou no hackathon para ganhar. Idealizar um projeto como a Inclusão Humanizada, sem dúvidas, não é para qualquer um.

Mas afinal, como o projeto que começou em um hackathon veio a se tornar algo maior? Confira o que diz Milena a respeito de como foi tirar esse projeto do papel:

“Eu já sabia que queria montar um projeto do tipo, antes mesmo do hackathon. Essa foi uma das coisas que me motivou a montar um grupo só com autistas, antes mesmo da inscrição. Não existia a obrigatoriedade de montar a sua equipe, esse foi um diferencial

Convidei pessoas que eu nem conhecia para participar, encontrei elas nas redes sociais, grupos de autismo… isso porque eu queria colocar em prática o conceito do protagonismo dos autistas nos projetos sobre o TEA. 

O projeto já era um desejo meu, e eu sabia que o hackathon seria uma boa oportunidade para ter mais visibilidade. Infelizmente, quando você é autista e tem uma ideia, um projeto, muitas vezes você não é ouvido. As pessoas tendem a não dar valor, considerar que são ideias “viajadas”, ou sem futuro. Eu entrei no hackathon para ganhar. Eu precisava dessa visibilidade justamente para dar continuidade a esse projeto. Então, quando o hackathon acabou, eu conversei com as pessoas do grupo que eu havia formado. A maioria das pessoas não continuou no projeto, por falta de tempo ou por não ser algo que elas desejavam fazer.

Como se formou a equipe atual da Inclusão Humanizada

Milena conta que, do grupo que fez parte do hackathon, hoje apenas uma integrante, a Suzana, ainda faz parte do projeto. Ela relata também que, depois da saída dos colegas que não tinham interesse em continuar com o projeto, entrou em contato com outras pessoas, também autistas, que fizeram parte de outros grupos do evento.

A fundadora do projeto, então, recrutou pessoas que sempre estavam participando e que via que estavam engajadas na causa. E foi aí que entraram para a Inclusão Humanizada a Carla, que também é autista e os irmãos Ilana e Yuri, ele também autista. Outra coisa muito legal foi terem se juntado ao projeto duas mentoras do hackathon. Uma delas é autista, a Paloma, e a outra é mãe de uma autista de nível 3, a Maria Augusta. Mais adiante também conheceram a Raquel, que se juntou ao time.

Inclusão do autismo

Fonte: arquivo pessoal cedido por Milena Yamamoto

Como começar o trabalho de inclusão nas empresas

Para começar a incluir as pessoas neurodiversas nas empresas, é necessário, antes de mais nada, pensar em formas adequadas e não capacitistas de fazer isso. Uma das coisas importantes que podemos aprender com a experiência da nossa entrevistada, é que é necessário adaptar o processo seletivo, mas sem tratar o candidato autista de forma infantilizada ou diferente de como seria com um neurotípico. Isso significa deixar claro quais são as funções executadas na vaga, quais habilidades e formações o candidato precisa ter, etc.

Sabendo qual é a principal missão da Inclusão Humanizada, nada mais justo do que pedir para Milena algumas dicas sobre como começar a fazer um trabalho de inclusão do autista nas empresas, não é mesmo?

Dando o primeiro passo em direção à inclusão

“Para começar, o próprio processo seletivo precisa ser humanizado. É preciso adaptar desde o início, por exemplo: geralmente, o recrutador liga para os candidatos. Para um autista, isso pode ser desconfortável. O melhor em muitos casos seria ligar apenas se isso for acordado, ou às vezes, não fazer ligações em geral. Grande parte dos autistas não gosta de falar ao telefone, e isso pode gerar um bloqueio já no início.

Outra coisa importante é evitar as dinâmicas, que muitos processos seletivos optam por fazer. Essas dinâmicas geralmente são prejudiciais para o autista. Isso porque envolvem questões como falar para grandes grupos de pessoas, e a própria interação com outros candidatos, que também é exigida, entre outros desconfortos que esse tipo de atividade pode gerar. 

Após contratar a pessoa autista, faz parte do trabalho de inclusão designar alguém para auxiliá-la a entender a rotina do trabalho nos primeiros dias. Essa prática de fato já acontece em algumas empresas, até para pessoas não autistas. Mas para muitos autistas, isso pode ser essencial.

É preciso dar espaço para a fala do autista. Ele precisa se sentir seguro e acolhido para dizer o que ele precisa quanto a adaptações, inclusão, acessibilidade… É essencial que ele tenha esse lugar para fala sem julgamentos e sem se sentir invalidado.”

A importância da inclusão na vida acadêmica

Falar sobre inclusão no ambiente escolar e acadêmico é de extrema importância, afinal, é dentro das salas de aulas que tudo começa. É necessário refletir a respeito disso, e não apenas refletir, mas pensar em formas de levar a conscientização para o corpo docente. Só assim será possível alcançar o ideal: que a inclusão comece nas salas de aula, independente da idade do aluno.

Milena teve o diagnóstico de autismo aos 28 anos de idade, depois de já ter se formado. Perguntamos se ela acredita que sua vida acadêmica teria sido diferente se ela soubesse que fazia parte do espectro antes de ingressar na faculdade. Confira a resposta que ela nos deu:

“Acredito que teria sido bem diferente, de fato. Depois do diagnóstico, é comum que o autista pare para analisar o passado e finalmente surgem algumas respostas. Eu tive muitas dificuldades na faculdade, era um curso de 4 anos, mas eu levei 6 anos e meio para me formar. Enfrentei dificuldades nas provas, e até para lidar com os professores.

Existe um despreparo de alguns professores até mesmo para lidar com os alunos neurotípicos. Quando os alunos são neurodivergentes, então, é ainda pior. Certamente, a maioria deles não sabe como tratar o autista, muito menos como adaptar o ensino, as aulas, os materiais, provas… Acredito que se eu soubesse que fazia parte do espectro, o simples fato de me conhecer e me entender melhor já teria ajudado muito.

Além disso, eu teria uma base de argumento. Na maioria dos casos só vai haver uma preocupação com a adaptação e inclusão se você tiver uma prova de que precisa disso. Infelizmente, ainda é assim que funciona hoje em dia.”

inclusão do autista

Fonte: Divulgação Inclusão Humanizada

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Este foi o nosso texto sobre a Inclusão Humanizada, um projeto criado e protagonizado por pessoas do espectro e focado na inclusão do autista no mercado de trabalho.

Você deseja entrar em contato a Inclusão Humanizada para apoiar o projeto, acompanhá-los nas redes sociais ou agendar um Workshop para a sua empresa? Então clique aqui e para ter acesso ao site e as redes sociais do projeto.

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