Epilepsia no autismo: a história real de um verdadeiro sobrevivente


Postado por Autismo em Dia em 11/jun/2021 - 11 Comentários

A epilepsia no autismo é uma das comorbidades mais sérias e preocupantes. Além das características recorrentes do transtorno, uma pessoa com epilepsia pode ter convulsões que, aparentemente, não têm hora para acontecer. A história que vamos contar hoje é um desses casos e vem de Goianinha, no interior do Rio Grande do Norte.

A Jaquelyne Sabino, mãe do Ruan, tem muita história para contar. E algumas ela, inclusive, contou para nós, do Autismo em Dia – mas só algumas. Porém, de todas as histórias que nós já trouxemos aqui, a da Jaquelyne é um daqueles casos raros e improváveis. Ruan é um verdadeiro sobrevivente. Um sobrevivente mesmo! Como Jaquelyne contou para nós, o menino literalmente morreu e voltou à vida enquanto ainda estava na barriga.

E este foi só um dos desafios que a gravidez trouxe. Depois que nasceu, Ruan apresentou alguns problemas de saúde que fez Jaquelyne ter outra visão do que é ser mãe. A seguir, você vai conhecer essa história emocionante. Acompanhe com a gente!

epilepsia autismo

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Jaquelyne Sabino

Índice

O nascimento conturbado de Ruan

Se, há algum tempo, alguém perguntasse para Jaquelyne se ela pretendia ter um terceiro filho, ela diria que não. Mãe de outras duas crianças, a jovem estava satisfeita com a forma com que a vida estava encaminhada. Por isso, quando descobriu a terceira gestação, foi uma surpresa que já estava ali há 4 meses.

Certa noite, Jaquelyne tropeçou em um brinquedo e caiu de costas. Ela achou que a pancada não tinha causado nada na gravidez, apesar de ter sido perigosa. Porém, estranhamente ela não sentiu ele mexer durante a noite. Na manhã seguinte, as cólicas atacaram, o que fez com que Jaquelyne fosse ao médico muito preocupada.

Lá, a obstetra fez todos os exames e, infelizmente, não encontrou mais sinais de batimentos cardíacos. A única saída, naquele momento, era interromper de vez a gestação, afinal, o feto não estava mais vivo, segundo a médica.

“Para uma grávida, receber essa notícia é devastador. Foi algo que eu não esperava descobrir. Primeiro porque eu nem esperava uma gravidez. Mas a partir do momento que você se acostuma a estar gerando uma vida, você se apega ao bebê. E de repente você descobre que o bebê morreu”, conta Jaquelyne.

A médica, então, disse que Jaquelyne ficasse internada para entrar em trabalho de parto e fazer a curetagem. (A curetagem é o procedimento de retirada de um feto). Entretanto, Jaquelyne escolheu não ficar, prometendo voltar à tarde depois que conseguisse quem ficasse com os outros filhos.

O que ela não esperava, era que esse intervalo de tempo mudaria toda a história.

O menino que ressuscitou

Depois da consulta, Jaquelyne chegou em casa chorando muito e teve que ser consolada pela mãe e pela avó.

“Eu me lembro que minha mãe colocou a mão na minha barriga e disse ‘não, meu neto está bem, tenha calma que ele só está dormindo'”, conta.

É difícil definir o que exatamente aconteceu, mas, de fato, pouco tempo depois, o bebê voltou a mexer. Junto com esse movimento, Jaquelyne sentia muitas dores e teve que voltar à maternidade. Ela precisava impedir que começasse o trabalho de parto, afinal, mal era o quinto mês de gestação.

Mesmo que ele ainda tenha demorado mais um pouco para vir ao mundo, Ruan acabou nascendo prematuro. Porém, de sete meses e não de 5. Nos dias que seguiram, o menino ficou na UTI antes de, enfim, poder ir para casa.

autista em dia

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Jaquelyne Sabino

Epilepsia no autismo e o desenvolvimento de Ruan

O diagnóstico de epilepsia chegou ao mesmo tempo em que Ruan demonstrava vários atrasos no desenvolvimento. Ele não engatinhou, não segurou o tronco e não começou a andar dentro do período em que era para ser. Isso trouxe preocupação para a família. No vai e vem de pediatras consultados, todos afirmavam que isso era o “normal” por Ruan ser prematuro. Só que o garoto fez 2 anos esse ‘tempo dele’ nunca chegava.

Dias depois do segundo aniversário, o garoto teve, então, a primeira crise convulsiva. Num período de 24 horas, Ruan teve 52 convulsões e nada parava as crises. Ruan teve que ir para a UTI. Durante os 11 dias que mãe e filho passaram no hospital, as médicas disseram não entender o motivo de tantas crises sem resposta dos medicamentos. Depois da alta, Jaquelyne saiu do hospital com encaminhamento para um neurologista. Porém, mesmo nos dois anos seguintes de acompanhamento, a única descoberta foi que Ruan tem epilepsia refratária.

“Eu sempre falava que tinha alguma coisa errada. Eu explicava que o comportamento dele não estava resumido a isso. Ele se isolava, não brincava com as outras crianças, não queria contato com os irmãos, chorava muito. Além disso, a fala era enrolada, ele andava na ponta dos pés e vivia agredindo a si mesmo. Então a gente começou a  questionar isso para o neuropediatra. Foi quando Deus colocou um anjo na vida de Ruan”, conta ela.

A Descoberta do autismo

O anjo a quem Jaquelyne se refere é uma mulher chamada Emily Brito, uma psiquiatra a quem tem uma gratidão gigante. Jaquelyne conta que a psiquiatra , desde o início, teve um posicionamento diferente. A Dra. Emily Brito, em vez de começar analisando Ruan, quis ouvir a mãe antes de qualquer coisa.

“Eu só sabia chorar na frente dela. Ela quis saber porque eu estava daquele jeito. Eu abri na frente dela um caderno onde eu mesma tinha anotado tudo que já tinha acontecido com meu filho. Inclusive, expliquei para ela que eu também me isolei das coisas e das pessoas por conta dele e dos comportamentos que ele tinha. Foi quando ela me perguntou se eu já tinha ouvido falar sobre autismo. Eu disse que não. Aí ela me explicou que o Ruan é autista e que provavelmente de grau severo. Eu saí de lá já com o laudo e encaminhado para várias terapias”.

Hoje, Jaquelyne guarda no coração as palavras que ouviu de outro profissional, o neuropediatra Dr. Francisco Sidione. “Como eu ouvi dele, o meu filho tem epilepsia no autismo, mas ele não é um diagnóstico”. Esse sentimento, como nós sempre defendemos aqui no blog, é essencial para ajudar mães, pais, avós e toda a sociedade a não limitar as expectativas em relação aos seus filhos autistas.

aprendizado TEA

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Jaquelyne Sabino

Além da epilepsia no autismo: quem é Ruan

Assim como muitos autistas, Ruan vive uma intensa rotina de terapias. Segundo a mãe, isso envolve psiquiatra, neurologista, fonoaudióloga, terapeuta ocupacional e psicóloga. Hoje, aos 6 anos, Ruan parece outra criança em vista do que era até os 4. O desenvolvimento é nítido. Inclusive, ele já se comunica de um jeito bem funcional. Apesar da gagueira que ele desenvolveu por conta de das convulsões da epilepsia junto do autismo.

“Hoje, ele já consegue sair de casa. Mas como ele é muito ligado à própria rotina, isso cria algumas limitações. Mas nós já sabemos em que lugares ele consegue estar, que barulhos incomodam etc. Na escola, apesar de algumas restrições, já não é como antes. Hoje ele consegue chegar mais perto, já consegue brincar. Não por muito tempo, mas consegue. Os médicos ficam admirados, afinal, por tudo que ele já passou, é surpreendente que ele seja assim. Ele é muito inteligente, ama música, ama números. Uma criança em desenvolvimento. Ele teve o diagnóstico de autismo severo, mas a gente acredita que ele vai reverter esse quadro“.

Epilepsia no autismo: uma nova mãe, uma nova vida

“O autismo chega assim. É como se a gente se preparasse para ir aos Estados Unidos e descobrisse que chegou na África”. É assim que Jaquelyne, em resumo, explica as mudanças que aconteceram na sua vida e de sua família.

“A gente idealiza um futuro inteiro. Mas aí vem o autismo e a gente passa pelo luto. Morrem vários sonhos seus porque a gente sabe que tem coisa que o nosso filho não vai conseguir fazer. Não é que eu não acredito, mas tem que coisas que eu vejo que ele não vai conseguir realizar. Mas a gente também descobriu que tem várias coisas que ele vai conseguir. E está apenas começando!

Mas é muito difícil. A gente aprendeu o quão difícil é depender de uma assistência de saúde falha. Aprendemos o que é preconceito, que a antes a gente só ouvia falar. E lutar por uma criança autista não é fácil, as dificuldades são enormes. Tem dia que eu consigo me comunicar bem com meu filho e tem dias que não. Tem dias que ele se expressa normalmente e tem dias que ele depende dos pais para tudo. E isso acarretou várias dificuldades. Por conta da epilepsia e do autismo ele precisa ser contido com força física, às vezes. Meu esposo nem pode ter trabalho fixo de sair todo dia porque minha força não dá conta.

A gente aprendeu a sambar conforme a música. Mas não é a nada que a gente não respire fundo e não siga em frente. Mesmo diante de tudo, eu não saberia viver sem. Nós crescemos como pai e mãe e como ser humano”.

Mãe blogueira

Quando a gente disse lá no início que ela nos contou apenas algumas histórias, entre tantas, não foi exagero. Jaquelyne chegou a passar por uma depressão e, atualmente, ela encontrou na internet uma forma de voltar à superfície, onde o sol brilha mais e o ar é refrescante. Em maio deste ano, ela criou o um blog onde vem diariamente compartilhando trechos de sua vida. A cada post, quase como episódios, ela fala de uma parte da história e leva os leitores a refletirem sobre isso.

Em pouquíssimo tempo, o blog vem tendo muitos acessos e, como dá para ver nos comentários, muita gente se identifica.

“Assim como eu precisei e recebi ajuda, tenho certeza de que tem outras mães precisando. Mesmo que não seja uma história parecida com a minha, talvez elas consigam tirar da minha trajetória alguma coisa de proveito“, diz. “Não é a história do Ruan. Não é sobre epilepsia no autismo. É a minha história como mãe, como mulher. Vou contar tudo, onde eu acertei e onde eu errei”, conclui.

Quem quiser acompanhar essa história, basta clicar aqui.

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Obrigado por acompanhar junto com a gente a história da Jaquelyne. Te convidamos a dar mais uma passeada aqui no blog conferindo outras histórias. Também estamos no Facebook e no Instagram, em uma comunidade formada por milhares de pessoas. Até a próxima!

 

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11 respostas para “Epilepsia no autismo: a história real de um verdadeiro sobrevivente”

  1. Christiane disse:

    História emocionante. Parabéns para essa trajetória difícil, mas cheia de vitórias.

  2. José Carlos da Silva Enedino disse:

    Olá também tenho um anjo que e altista hoje com 17 anos sofre com crises colvusilvas que com 1 mês de vida ficou internado com água parto pois foi mal aspirado que teve ernia pois fazia força pra luta pela vida que com no seu 1 ano de vida foi operado de 2 ernias aos três anos quebrou a cracula já duas vezes hoje tá aqui firme e forte , e agora sofrendo com crises convulsivas…..

  3. Lis disse:

    História emocionante, mas a metáfora sobre África foi totalmente desnecessária e preconceituosa e aposto que nem conhece os países da África (já que são vários)e somente as “tragédias” que a mídia brasileira apresenta. Enfim…

    • Autismo em Dia disse:

      Olá, Lis! Ficamos felizes que tenha gostado da história. 💙
      Acreditamos que a entrevistada não tenha feito essa metáfora de forma pejorativa ou a fim de exaltar um lugar e inferiorizar outro, mas sim como forma de comparação de quão distantes e diferentes os locais são entre si.
      Um abraço!

  4. Taina disse:

    Oi tenho um filho q deve a primeira crise convulsiva com 11 mês de vida hj ele tem 5 anos hj ele está no 4° remédio para controlar a crise e tenho minha dúvida que ele tem autismo estou aguardando resolver o remédio certo pra ele, para que a médica examine o autismo.

    • Autismo em Dia disse:

      Olá, Taina!
      O médico indicado para investigar o autismo é um neuropediatra. Esperamos que encontre respostas em breve e que consigam encontrar o remédio adequado para controle das crises o quanto antes.
      Um abraço!

  5. Eurípedes Ferreira Júnior disse:

    Hoje, 20 de outubro de 2022 minha filha teve um episódio inédito, três crises convulsivas no mesmo dia.
    Sou o Júnior, pai em carreira solo há 5 anos de uma princesa chamada Júlia de 16 anos de idade completos em janeiro. Diagnosticada aos 4 anos com traços do espectro autista, recebeu muitas terapias através de psilcóloga, fonoaudiólogo, neuro. Aos 9 anos a primeira crise com ausência que evoluiu para tônico e clônico depois de 2 anos de ausência. Em 2020 diagnosticada como refratária fazendo uso de diversos medicamentos e óleo de canabis sativa e Canabidiol gotas diluído. Tantos remédios, custos extremamente altos para um pai que vende o almoço para comprar a janta. Diga-se de passagem o quão orgulhoso eu ficaria em ter esses gastos se as medicações trouxessem resultados. Já tentamos (pai e médicos) dobrar a dose da medicação, triplicamos a dose, associamos medicação, mas tudo sem resultado.
    Hoje um episódio inédito para minha Júlia. Ela teve uma crise as 14hs no colégio, as crises são sempre entre dois e três minutos de duração e ela após a crise volta a consciência em menos de um minuto. As 23hs a segunda crise para meu espanto. Voltou em segundos mas muito cansada. Conduzi para a cama e ás 23:50 a terceira crise, mas com uma diferença. Quando acabou a crise ela deveria voltar a consciência, mas isso levou muito tempo. Passaram cinco minutos, dez minutos e nada. Eu tentava estimulos visuais, estimulos auditivos e nada. Sem refexo nenhum, olho parado, sem fala, babando, batimentos altos e apenas após passados 15 minutos ela voltou extremamente exausta, olhos vermelhos lacrimejando e um pouco de baba escorrendo. Lembro que nada disso nunca tinha acontecido como citei no início.
    Faço esse relato a fim de trocar experiência com alguma outra família que já passou ou passa por isso. Preciso muito de ajuda e os médicos apenas seguem protocolos. Ninguém sabe nada, minha filha é uma cobaia de laboratório de médicos. Peço gentilmente ajuda daqueles que puderem somar. Dispenso curiosos, por favor.
    efjunior_@hotmail.com

    • Autismo em Dia disse:

      Olá, Eurípedes.
      Sentimos muito pelas dificuldades em controlar as crises. Indicamos sempre procurar por diferentes profissionais e especialistas para que o caso dela seja visto de diferentes ângulos e torcemos para que encontrem o melhor tratamento possível em breve. Você também pode procurar neurologistas especializados no tratamento da epilepsia farmacorresistente para tratamentos alternativos.
      Um abraço!

  6. Eurípedes Ferreira Júnior disse:

    Porque foi deletado meu relato?

    • Autismo em Dia disse:

      Olá, Eurípedes! Seu comentário não foi deletado e já está disponível. Os comentários só aparecem depois de passar pela nossa moderação para filtrarmos qualquer conteúdo impróprio ou que vá contra os nossos regulamentos internos. Um abraço!

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