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Postado por Juliana Canavese em 30/set/2024 - Sem Comentários
Quando falamos em espectro autista, é fundamental entender que, apesar das classificações em Nível 1, Nível 2 e Nível 3 de suporte, cada pessoa no espectro é única e tem sua própria história. Hoje, vamos conhecer a trajetória de Clarissa Nunes Botelho Lemos, de 40 anos, casada e mãe de dois meninos: Tomás, de 11 anos, e Davi, de 7 anos.
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Clarissa é advogada de formação, mas sua vida tomou um novo rumo após o nascimento dos filhos, principalmente Davi. Ele necessita de atenção constante, 24 horas por dia, pois não tem noção de perigo ou espaço. Davi, que é autista não verbal, começou a aprender comunicação alternativa através de um tablet.
Embora Clarissa se defina principalmente como mãe e esposa, ela fundou, junto com outras famílias atípicas, a AMA (Associação dos Amigos dos Autistas) em 2023, onde atua voluntariamente. Além disso, é Presidente do COMDEF (Conselho Municipal das Pessoas com Deficiência) em sua cidade. Davi, por sua vez, é diagnosticado com autismo nível 3 de suporte e deficiência intelectual severa.
A família, originalmente do Ceará, mudou-se para Santa Catarina em 2017, durante a gravidez de Clarissa com Davi. Hoje, vivem em Joaçaba há três anos e meio. A gestação e o pós-parto de Davi transcorreram sem problemas, e ele apresentou um desenvolvimento normal até os 8 meses de vida, quando começou a caminhar e a balbuciar. No entanto, com 1 ano, ele não atingiu marcos de desenvolvimento esperados para sua idade.
O marido de Clarissa, médico, logo percebeu sinais de alerta. Davi tinha comportamentos atípicos, como preferir ficar sozinho e focar em detalhes incomuns, como o parafuso de um carrinho. Aos 1 ano e 3 meses, seu pai suspeitou que ele estivesse no espectro, o que foi confirmado por dois neuropediatras aos 18 meses de idade.
Clarissa conta: “Davi caminhou aos 8 meses, fazia sons tipo: bababa, papapa. Mas com 1 ano de idade Davi não atingiu alguns marcos do desenvolvimento esperados para aquela idade. Meu esposo que é médico ficou em sinal de alerta. Ele sempre foi um bebê que preferia ficar sozinho no berço, ele não dava função aos brinquedos. Ele não brincava com os pares, ele tinha sempre um comportamento diferente das outras crianças… quando Davi tinha 1 anos e 3 meses o meu esposo falou que achava que Davi era autista. O que me preocupava era o fato do Davi não falar, mas eu não me preocupava com um transtorno. Foi então que chamei atenção da escola, que ainda não tinha despertado para isso…
Clarissa relata que uma das grandes dificuldades no início foi o sono de Davi, que dormia tarde e acordava nas primeiras horas da manhã. Após muitas consultas, foi receitada melatonina, o que trouxe receio inicialmente. Com o tempo, Clarissa entendeu a importância de garantir o sono de qualidade para Davi e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida de toda a família.
“Eu tinha aquela coisa dentro de mim, aquele receio, meu Deus eu vou dar melatonina para meu filho, vou colocar o meu filho para dormir. Eu demorei 6 meses pra entender que meu filho precisava da melatonina para ele ter um sono de qualidade e a gente enquanto família também termos mais qualidade de vida.
Só despertei pra isso porque a psicóloga que acompanha Davi me orientou a dar a melatonina pra ele, por que eu e o Tomás não tínhamos mais qualidade de vida, vocês precisam dormir, o Davi precisa dormir. E aí nós começamos a melatonina, depois começamos as outras medicações que eram necessárias.”
Davi entrou na escola com apenas 1 ano, e Clarissa esperava que a interação social pudesse ajudá-lo a desenvolver a fala. No entanto, ao chegar na fase de alfabetização, aos 6 anos, ela se deparou com o luto pelo diagnóstico, que não havia vivenciado antes. O degrau de diferença entre Davi e as outras crianças tornou-se evidente. Foi um processo doloroso, mas fundamental para compreender as necessidades de seu filho.
Desde o diagnóstico, Davi passou a frequentar terapias ocupacionais e psicológicas. Hoje, ele realiza duas sessões de fonoaudiologia por semana, usando comunicação alternativa com o iPad, além de frequentar a APAE, onde recebe atendimento pedagógico especializado. A rotina é intensa, com atividades educativas e terapias diárias.
Ao mudar-se para Joaçaba, Clarissa percebeu a falta de suporte para autistas na cidade, o que a motivou a fundar a AMA, juntamente com outras famílias atípicas. A associação nasceu do desejo de garantir atendimento especializado e acessível não apenas para Davi, mas para todas as famílias de crianças autistas na região. Hoje, Clarissa representa a AMA em quatro municípios: Joaçaba, Herval D’Oeste, Luzerna e Catanduvas.
Clarissa ressalta que o autismo é frequentemente romantizado, com ênfase em casos de autistas com altas habilidades. No entanto, a maioria dos casos, como o de Davi, envolve autismo de nível 2 ou 3 de suporte, e muitas famílias ainda enfrentam grandes desafios para acessar atendimento de qualidade.
“O Davi colocou nossa família a par de uma situação que vai mais além dele. Hoje a gente estuda sobre o autismo, porque o Davi nos apresentou essa realidade. Eu me considero uma ativista. Mas enquanto Presidente da AMA, eu não estou aqui pelo Davi, mas sim por conta de todas as pessoas que precisam também. A luta vai muito além dele.
A representação, a bandeira do autismo, a pessoa com deficiência, neurodivergente, essa luta vai continuar existindo independe do Davi, independente da minha família e temos que nos unir como família, como sociedade, para lutar por isso, para garantir que crianças autistas sejam adolescentes autistas com autonomia, adultos autistas com autonomia para viver em sociedade.”
Vemos muito na internet a fala de que mães atípicas não têm o direito de morrer. A mãe atípica se questiona muito como vai ser o suporte para seu filho quando ela morrer?
“A gente se preocupa hoje com políticas públicas que trabalhem a ideia de que o autista vai crescer. O aumento do número de autistas na rede municipal de educação foi de 40% esse ano”
A história de Clarissa é um exemplo inspirador de como o amor por um filho pode transformar não só a vida de uma família, mas de toda uma comunidade. Ao fundar a AMA, Clarissa e sua família passaram a lutar por uma causa maior, buscando garantir que crianças autistas possam crescer e se tornar adultos com autonomia. A luta dela vai além do Davi, e serve como um chamado para toda a sociedade se unir em prol da inclusão e do respeito às pessoas neurodivergentes.
Clarissa deixa uma mensagem para todos: ” O preconceito limita, a inclusão liberta. O que você pode fazer para ser um agente de transformação na sociedade? Qual diferença você pode fazer na sociedade? Como você pode agir de forma positiva na sociedade em relação às diferenças, em relação a todas as pessoas com deficiências que precisam ser acolhidas e vistas?
E para as famílias atípicas que estão vivendo um momento de descoberta e luto, deixo um sinal de esperança para todas elas. O fundo do poço é onde pegamos impulso, se a gente pensar assim a gente vai conseguir proporcionar o tratamento que a pessoa precisa.”
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